domingo, 16 de setembro de 2007

Inclusão com arte, muita arte...

Nas tardes de sextas-feiras, a Igreja Martin Luther, localizada no centro de São Paulo, transforma-se em abrigo aos moradores de rua. Após o culto luterano, voltado para os problemas deste grupo, os desabrigados interessados participam de atividades culturais e de um bate-papo. O projeto oferece um espaço para que eles, através da arte, expressem suas capacidades e não fiquem na ociosidade.


Cerca de 260 pessoas se aglomeram no pátio interno da Igreja à espera do "cafezinho". Três bacias de café enganam a fome deles até o final das preces. Com a igreja lotada, o culto, animado por músicas e histórias bíblicas, antecede à distribuição do vale-refeição.


"Não se sabe - de fato - se estes moradores de rua freqüentam a Igreja em busca da 'palavra de Deus' e do projeto desenvolvido para eles ou simplesmente pelo vale-alimentação", questiona a pastora Vera Cristina Weissheimer, de 37 anos. Mas, é certo que, para as atividades culturais realizadas após as orações, o grupo se restringe a cerca de 30 moradores, que esperam ansiosamente pelas sextas-feiras.


São dois grupos de atividades que dividem o espaço no Centro de Convivência da Igreja. O primeiro, conhecido como "Sonho de Artista", produz artesanato e conta com a presença permanente de 10 a 12 moradores de rua. "O projeto tem por objetivo ensinar valores e recuperar a cidadania que foi perdida pelos anos de rua e de exclusão social", afirma Janete Bachtold Ludwig, de 49 anos, uma das responsáveis pelo grupo de artes.


As atividades artísticas são selecionadas e organizadas de acordo com cada época do ano. "Por exemplo, no Natal, a gente cria cartões com temas natalinos. Já na Páscoa, fazemos ovos de chocolate e enfeites nas cascas ocas de ovos de galinha. No final, vendemos e ganhamos um dinheirinho", comemora o assistido Pedro Francisco Knupp, de 47 anos. Para ele, o projeto levanta a auto-estima e o espírito do povo da rua.


Aproveitando materiais recicláveis e doados, a estudante de artes plásticas e também responsável pelo projeto, Débora Ludwig, de 19 anos, orienta o grupo sobre as técnicas utilizadas e as fases de produção. "Muitas vezes, eles não entendem o que estão fazendo ou não gostam do resultado de seus trabalhos, mas isso acontece porque a arte está fora do cotidiano deles", relata a estudante. "Por isso, ensino que tudo é arte, desde que seja a expressão do que eles estão sentindo no momento".


Para os moradores de rua mais necessitados, existe também o grupo de bate-papo, apelidado por eles de "Grupo de Conversa que faz bem" e comandado pela pastora Vera. A cada semana, durante uma hora, o grupo de 16 a 18 pessoas fala de seus problemas e êxitos. Escolhem, então, um tema que será debatido no dia, como: albergues, violência, perdão e até a Copa do Mundo na Alemanha. "Aqui, eles deixam suas preocupações, seus sacos pretos imundos. Aqui aprendem que não são apenas vítimas, mas também responsáveis por terem chegado à rua", conta a pastora.


O carinho e a cumplicidade fazem dos moradores de rua e dos voluntários uma grande família em busca de uma nova vida. Longe das ruas, a chance de voltarem à bebida, às drogas, ao ócio e até ao crime é muito menor. "Esse projeto é a minha terapia. Enquanto tenho uma ocupação, esqueço as coisas ruins do mundo", relata Antônio Pedro, de 47 anos, que deixou de beber há 5 anos, quando começou a freqüentar os projetos da Igreja.


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