quarta-feira, 19 de setembro de 2007

Violência e Invisibilidade


O cineasta Bruno Barreto está produzindo 174, filme sobre a tragédia dos meninos da Candelária. O documentário de José Padilha, Ônibus 174, serviu de base para a pesquisa de Barreto.


Abaixo, uma reflexão sobre o documentário Ônibus 174:


O documentário Ônibus 174, dirigido por José Padilha, detalha o seqüestro de um ônibus, mostrando a trajetória do seqüestrador, o ponto de vista da polícia, dos reféns e da mídia.No dia 12 de julho de 2000, um ônibus repleto de passageiros foi seqüestrado por Sandro Rosa do Nascimento, no bairro do Jardim Botânico, Rio de Janeiro. Durante quatro horas e meia, o caso ficou em negociação com a polícia. Apesar de delicada e perigosa, esta situação foi transmitida ao vivo pela televisão, já que a polícia não isolou a área e permitiu o acesso da mídia, que se expôs ao perigo para captar as melhores imagens. Enquanto as vítimas sofriam, a mídia fez se show. Mas o que não esperavam era o fim trágico deste seqüestro, que acabou com a morte de duas pessoas: uma refém, devido a um erro policial e Sandro, asfixiado no camburão.


Neste documentário, são mostrados diversos aspectos de nossa sociedade. Desde um ex-menino de rua, que, por causa de um drama familiar se envolveu com drogas e com o crime, até o despreparo da polícia brasileira. É um documentário com extensa apuração dos fatos, diversidade de opiniões e que nos deixa perplexos quando acaba. José Padilha não propõe soluções, apenas nos faz pensar.


Violência e Invisibilidade
No Brasil existem, aproximadamente, oito milhões de meninos de rua. Sandro do Nascimento era um deles. Nascido na favela do Rato Molhado, no Rio de Janeiro, ele saiu de casa aos seis anos, depois de presenciar o assassinato de sua mãe. Trauma que iria lhe acompanhar pelo resto da vida. Ao ir para as ruas, integrou-se em um grupo de meninos que mais tarde viveriam sob a Igreja da Candelária.


Sandro praticava pequenos furtos, envolvendo-se com drogas (cola e cocaína), um refúgio para sua vida trágica e sofrida. Foi Sempre tímido, seus amigos diziam que ele não gostava de falar sobre a família e o dinheiro que conseguia usava para comprar entorpecentes.


Em 1993, foi um dos sobreviventes da chacina da Candelária, na qual sete menores foram assassinados. Sandro passou pela cadeia inúmeras vezes e fugiu outras tantas. Todos esses fatos, incluídos com o uso de drogas, contribuíram para que ele fizesse o seqüestro, que foi definido por especialistas, como um roubo interrompido.


O caso do ônibus 174 pode ser considerado como uma extensão da tragédia da Candelária. Sandro, que era vítima, tornou-se algoz de um novo crime, despertando a sociedade para sua existência. Através do assalto que se converteu em seqüestro, Sandro redefiniu seu relato e sua existência social, convertendo a narrativa, passando a ser protagonista da situação. Com a arma nas mãos, causando medo em quem estava em volta, enfrentando a polícia e as câmeras de televisão, ele se redefiniu, ganhando reconhecimento social, tendo visibilidade. Ele foi o próprio protagonista do caso, capaz de encenar um morte e de dirigir o comportamento de cada uma das vítimas.


Sandro não era considerado um cidadão, mas ao impor sua visibilidade através do medo, ganhou status. Como menino de rua, ele era invisível aos olhos da sociedade que aprendeu a conviver com a desigualdade social, desviando o olhar das pessoas. A violência, nesses casos, é como um grito desesperado e impotente por visibilidade.


O seqüestro do ônibus 174 aconteceu em um período no qual as pessoas estavam se deslocando, de casa para o trabalho ou vice-versa. Elas passavam de pessoas morais, reconhecidas, para indivíduos. De acordo com Roberto da Matta, em As Raízes da Violência no Brasil, é quando a pessoa está individualizada, tornada em um "ninguém" que há maior risco de acontecer atos violentos. E foi exatamente isso que aconteceu. A violência, para Sandro, se deu como o desenvolvimento da cidadania através do medo.


Quando o crime chegou ao fim, com a morte de uma refém e com a captura do criminoso, a população queria linchá-lo, já que nele projetou-se toda a culpa pela violência social. A sociedade quer a invisibilidade desses meninos, quer que eles continuem em pocilgas, não quer assumir sua responsabilidade pelos atos desses inúmeros sandros.

Um comentário:

Unknown disse...

Faltou muito prepáro dos policiais,em relação a armamento de alta tecnologia para atiradores de elite,rádios comunicadores,treinamento,inteligência emocional de alguns e ética para o Bope e os policiais que mataram a Geísa e o Sandro sem necessidade.